3 de julho de 2011

1ª reportagem: transporte público para deficientes

A reportagem abaixo, foi um trabalho realizado para a disciplina Redação Jornalística I, no 1º semestre de 2010. O desafio proposto pela professora Carmen Cagno era realizar uma matéria fria, relevante, com várias fontes (entrevistados) e de no mínimo três laudas (páginas).

A ideia de abordar o transporte público para deficiente, surgiu devido a minha preocupação com as pessoas com mobilidade reduzida e que tem grandes dificuldades de locomoção na cidade de Ribeirão Preto-SP.

A partir daí, começaram as pesquisas na internet para descobrir quais seriam as fontes mais interessante e os seus contatos. Depois veio a melhor parte e a mais complicada: conseguir contato com a fonte e agendar a entrevista. É claro que nós, repórteres, aceitamos qualquer horário e local que a fonte propor. No meu caso, a maior dificuldade era conciliar as entrevistas com o horário do meu trabalho (na época, era desenhista em um escritório de arquitetura) e com os horários de aula. Mas tudo o que é mais difícil, também é mais gostoso. E a minha vontade de ver o resultado do trabalho, me instigou ainda mais.

Sonia e Jeferson, o casal de cadeirantes entrevistados, não foram somente duas fontes para uma importante reportagem. Eles passaram a fazer parte do meu grupo de amigos e já realizamos diversos projetos juntos, conforme você poderá acompanhar no Robin Hood de Saia

O repórter tem o prazer de conhecer pessoas incríveis a cada reportagem que ele começa. Agradeço muito a minha profissão, por me proporcionar isso.

Acessibilidade e Sensibilidade: duas coisas de que eles precisam

Acorda às 6h, se arruma, toma o café, vai para o ponto de ônibus pegar o transporte coletivo e ir para o trabalho. Espera dez minutos, espera vinte minutos, espera quarenta minutos. Lá vem ele! O ônibus aponta na esquina. Começa a desviar do buraco na calçada, depois de um morro de saco de lixo bem em cima da rampa. Agora sim, fica de prontidão, só aguardar o veículo parar. O ônibus para, o motorista desce, mas o elevador não. Mais uma vez o elevador não funciona! Sem ter como embarcar, fica no ponto novamente, até o próximo ônibus adaptado passar. Espera vinte minutos, espera... espera... A vida passa, a paciência passa, só o ônibus que não. Fica difícil assumir compromisso, se precisar utilizar o ônibus para chegar até o seu destino. E assim é a rotina de um deficiente que depende exclusivamente de transporte coletivo para se locomover.


Ribeirão Preto-SP conta atualmente com uma frota de 311 ônibus, 84 linhas e 30 vans do Leva e Traz para atender todos os usuários de transporte coletivo. Do total destes veículos, somente 77 ônibus e 16 vans são adaptados para pessoas com deficiência ou com a mobilidade reduzida. Das 16 vans disponíveis aos deficientes, somente 14 estão em circulação constante, as outras duas ficam de reserva, caso outro veículo tenha problema.


O sistema atual de transporte coletivo na cidade é o mesmo desde 1984. O modelo adotado na cidade é baseado em um sistema radial, onde todas as linhas convergem para o centro e também em linhas circulares, diametrais e perimetrais. Há três permissionárias que oferecem transporte coletivo ena cidade: Transcorp, Turb e Rápido D’Oeste. Atualmente, a Turb disponibiliza 43 ônibus adaptados, a Rápido D’Oeste 21 e a Transcorp 11. Mas esse número ainda não é suficiente para atender os 68.000 deficientes residentes em Ribeirão Preto, segundo dados do Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência.
 
Jeferson Andrade esperando o ônibus adaptado da Turb, linha Jardim Amália
A NBR 14.022 diz que até 2014 todo o sistema de transporte coletivo, incluindo não só os veículos, mas também pontos de parada e terminais, deverá estar adaptado de forma a assegurar o uso pleno com segurança e autonomia por todas as pessoas. A norma define como veículos acessíveis quando esses possuem as seguintes características: piso alto com embarque elevado externo ou plataforma elevatória, comunicação visual e tátil, 10% ou mais de assentos preferenciais, área reservada para cadeira de rodas e cão-guia, pontos de apoio em amarelo, interruptores com símbolos de parada, perfis nos degraus e o Símbolo Internacional de Acesso (SIA).

VEÍCULOS ADAPTADOS
No ano de 2008, existiam apenas oito veículos adaptados em Ribeirão Preto. Esse número começou a aumentar a partir do ano passado, com um acréscimo de 70 ônibus adaptados na frota. De acordo com dados oferecidos pela Transerp, as linhas que têm maior demanda de usuários com algum tipo de deficiência são: Ribeirão Verde, Jardim Amália, Jardim Heitor Rigon, Fórum, Iguatemi e Hospital das Clínicas. Sendo que parte dos veículos dessas linhas são adaptados.

O diretor de Transporte da Transerp, José Mauro de Araújo, afirma que Ribeirão Preto entregará toda a frota adaptada até 2012. Ele explica que todos os veículos adaptados em circulação já atendem os requisitos pedidos pela norma técnica. José Mauro garante que todos os motoristas passam por um treinamento constante para manusear corretamente as plataformas elevadiças. “Eles passam por reciclagens constantes. Nós não temos reclamações nesse sentido. São treinados pelas empresas para oferecer o melhor para o usuário. Tendo o equipamento, eles já são treinados para isso”, explicou.


O diretor também garante que os veículos adaptados atendem todas as pessoas com rapidez, conforto e segurança. Já a presidente do Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência, Sheila Aparecida Saldini Simões, afirma que os veículos adaptados “não atendem todos os deficientes nem com rapidez, nem conforto e nem segurança”. Ela explica que recebe reclamações diárias sobre veículos que não dessem o elevador, outros que não abrem a porta ou quando o deficiente se posiciona na plataforma, essa não se eleva.


Para Sheila, a maior dificuldade que o deficiente tem no sistema de transporte é a falta de acessibilidade. Rampas com inclinações inadequadas, falta de cobertura nos pontos, equipamentos sem manutenção e o descuido de alguns motoristas de não estacionar rente a calçada contribuem para a inacessibilidade do deficiente.

VANS DO LEVA E TRAZ
A presidente do Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência apontou também o número insuficiente de vans do Leva e Traz para atender a demanda dos que necessitam desse tipo transporte, que é elaborado para atender as pessoas que não conseguem sentar ou que precisam de tubos de oxigênio. “Nós temos uma lista de espera de 98 pessoas cadastradas aqui no conselho”, declarou Sheila.

Sonia Maria Soranzo, de 50 anos, é cadeirante e utiliza o Leva e Traz todos os dias. A van a busca em sua residência, no bairro Jardim Amália, e a leva até o seu trabalho na escola Albert Sabin, onde é telefonista. Sonia explica que o sistema de transporte do Leva e Traz dá prioridade a saúde, educação e trabalho, mas não oferece transporte destinado ao lazer. “Uma coisa que está muito difícil para o deficiente é o lazer. A gente pode ir num shopping, numa praça, mas aqueles deficientes mais debilitados ficam numa situação complicada”, afirmou Sonia. “Eles saem de uma fisioterapia e vão para um hospital. É um ambiente de sofrimento. Então, não tem um ambiente que eles vão para se alegrar”.

PROBLEMAS NA ACESSIBILIDADE
O marido de Sonia, Jeferson Andrade, de 45 anos, também é cadeirante e utiliza com frequência o transporte público. Jeferson apresenta algumas queixas em relação aos veículos. “Sempre dá problema. Dá problema na hora de elevar e descer”. Ele cita alguns empecilhos na hora do embarque: “Os motoristas tem que parar perto da calçada, porque a rampa tem que ficar rente a ela. E muitas vezes a calçada é esburacada ou então tem sacos de lixo nas rampas”.

“Às vezes você pega um motorista que ele não sabe manusear a rampa. É uma coisa que ele não está acostumado. Aí acaba atrapalhando o itinerário dele, por falta de treinamento”, disse o cadeirante Jeferson Andrade.

Jeferson acredita que falta treinamento aos motoristas para manusear a plataforma elevadiça. “Às vezes, você pega um motorista que ele não sabe manusear a rampa. É uma coisa que ele não está acostumado. Aí acaba atrapalhando o itinerário dele, por falta de treinamento”, explicou.


Ao contrário do que diz o diretor de Transportes, Sheila Simões diz que os motoristas não estão preparados para atender os cadeirantes, mas isso ocorre devido às várias funções designadas a eles. “É humanamente impossível uma pessoa dirigir um ônibus, cobrar, voltar troco e ainda ajudar a pessoa com deficiência”, declara.


O casal de cadeirantes, Sonia e Jeferson, conta que dias atrás ficaram três horas debaixo de chuva, na Rua Cerqueira César, esperando o ônibus. “O nosso ônibus quebrou e aí colocaram um ônibus para andante e não para cadeirante. Tirou um adaptado e colocaram um normal. Era o Jardim Amália”, contou Jeferson.


O deficiente visual Luis Gonzaga Peres, da Associação dos Cegos, comenta sobre a falta de cobertura nos pontos e os problemas que os deficientes visuais enfrentam no transporte público. “Nos pontos da rodoviária colocaram umas coberturinhas, mas se tiver chuva mais grossa, não tem como você se esconder”, declarou. “Eles deviam sinalizar os pontos pra gente. Porque se estivermos sozinho, a gente não sabe qual ônibus está vindo. Muitas vezes o ônibus para e você não ouve por causa do tumulto”.

FALTA DE SENSIBILIDADE
Se já não bastassem todos os problemas de acessibilidade no transporte público, os deficientes têm que enfrentar outro grande problema, que é a impaciência e a insensibilidade das pessoas sem deficiência. Segundo Sheila Simões, um dos maiores problemas do transporte público são as pessoas que não respeitam os deficientes. “Para essas pessoas, o deficiente é simplesmente mais um dentro do transporte coletivo. Ele não é visto como uma pessoa que tem necessidades especiais“.

Jeferson diz que as pessoas ficam um pouco nervosas quando o motorista estaciona para embarcar um cadeirante. “O povo fica nervoso e eu não sei o porquê. Uma vez que o ônibus tem o símbolo para cadeirante, ele sabe que uma hora, o veículo vai ter que parar para pegar um”, desabafou. “Então, essas pessoas têm que ter respeito e consciência de que vai embarcar um deficiente”.

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